Na análise dos contos de fadas da tradição ocidental, sob o prisma de Freud, devemos nos valer da distinção por ele feita entre conteúdos latentes e manifestos, a mesma usada na 'Interpretação de Sonhos' ( Die Traumdeutung, 1915 ).
Chapeuzinho Vermelho sai de sua casa rumo à de sua avó. Teme o lobo mau, ou será que o deseja? Ao chegar encontra vovó comida pelo lobo, mas viva. Como assim? Foi comida no sentido literal, ou no figurado? Havia essa mesma gíria na Alemanha dos irmãos Grimm. Pouco provável! Ou...? Mas a questão parece irrelevante, pois se de fato sobreviveu, a vovó não foi devorada pela boca... Trata-se de uma alegoria sexual quase explícita, como quis certo produtor italiano de cinema? Ou de uma censura contra a violência extrema de uma velhinha dilacerada em carnes por um animal feroz...Para Freud, nada disso ! O conteúdo latente explica tudo: pulsões sexuais. Chapeuzinho deseja o lobo, que transa com a vovozinha ( se soubesse que a jovem estava chegando, o que poderia ter feito? ), mas na hora H o caçador muito bem dotado de arma potente, extermina o mal-intencionado lobo, e se regozija de alegria com (o) Chapéuzinho Vermelho.
Felizmente, para a civilização ser viável, e não terminarmos todos comidos por nossos próprios lobos-homens-canibais, há uma instância chamada SupraEu ( Superego, na tradução mais corrente...), que 'castra' os desordeiros(as) antes que ajam, através da repressão ( Verdrängung ), e faz de nossas vidas, meros conteúdos MANIFESTOS, aparências, MÁSCARAS, por trás das quais só podemos encontrar infinitas outras máscaras...
Fica a pergunta: se não podemos atuar senão segundo máscaras, mais ou menos impostas por forças desconhecidas de nós mesmos, qual pode ser o critério a distinguir o real e o irreal.
Sobre qual dessas máscaras se fundamenta nosso conceito de realidade?
Leitmotiv da Tese de Doutoramento "Genealogia do Real ( Nietzsche e Freud )", junto ao Departamento de Filosofia da USP.
Republicaremos os textos mais significativos deste blog, sempre que possível.
ReplyDeleteTenho uma hipótese: Nossa máscara seria construída a partir do desejo do Outro( nossos primeiros amores) , assumindo o como sendo nosso, na expectativa de sermos aceitos e amados! Isso nos daria a ilusão de nos proteger do desamparo fundamental !! A mascara só começa a derreter qdo passamos a assumir o nosso desejo como desejo do Outro!
ReplyDeleteMuito interessante seu comentário, amiga. A questão que me ocorre ao lê-lo é se as máscaras são em número finito, ou se mesmo esse nosso Eu mais profundo, que emergeria após reconhecermos nosso 'desejo como desejo do outro' também não passa de mais outra máscara.
ReplyDelete